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Europeias e Abel Varziam: "ainda não estamos na cama"

por Fátima Pinheiro, em 25.05.14

           O Pe Abel Varziam

           fotografia da net

 

O título deste post era para ser outro. Era “Europeias, Salazar, Abel Varzim: Silêncio que vai cantar a abstenção?” Mas como hoje e ontem é proibido fazer campanha! E como este blogue tem um peso brutal na escolha dos portugueses, mudei logo. Só queria dizer que não concordo com esta regra. Então não devia ser “esclarecer” até à urna? Mas realmente as campanhas são o que são. Esclarecem? Da Europa, que é o caso, o que ouvi dizer nestas últimas semanas? Ataques ou braços e abraços por uma causa comum? Bocas indiretas ou interfaces diretos? Mais do assunto que está hoje nas mesas, ou de outras que se aproximam, a passos curtos? Se ligo a Televisão, e mesmo nos canais que se dizem de informação, do que sou informada? Nem comento. Liguem. Liguem.

 

A cantoria parece-me outra. Tem razão o “Melhor do que falecer”: ò Malhão, Malhão, que vida é a tua? Confesso que nunca me tinha lembrado que o folklore está impregnado de filosofia. Isto tudo para dizer que, se bem que não adore os franceses, há coisas que só eles sabem soutenir. Têm um programa de divulgação e debate, cujo título é “On n’est pas couché.” Que pena, pensei e bem, não termos nada assim. O que está em epígrafe não é a tradução correta, porque deitados andamos há muito. E para fazer justiça ao dito programa, seria melhor recriá-lo com outro título, do género: NESSUN DORMA.

 

Mas que sortuda eu sou! O programa está aceite por um homem da informação. Tudo a postos. Tive foi que ir para a cama com ele. Mas então, a cama serve para muitas coisas. E é melhor se tiver atualidade, expertise, vivacidade, música, voz off, curiosidade e dinamismo. Mas como hoje a ordem impõe silêncio, deixo umas palavras sobre Abel Varzim, que esteve nesta semana na Assembleia da República. O “santo” vê mesmo mais longe?

 

D. Manuel Clemente, na sessão comemorativa dos 50 anos da morte do fundador da Liga Operária Católica (LOC), que decorreu esta terça-feira, no auditório do edifício Novo da Assembleia da República, falou alto e a bom som. Diogo Freitas do Amaral e Guilherme de Oliveira Martins, destacaram outros traços de pensamento e ação desta grande figura da Igreja e da Sociedade Portuguesa. O Patriarca deixou um apelo a que se estude o seu pensamento. E deu razões. Ainda na 4ªfeira ao almoço, uma pessoa que participou no evento disse-me que “os textos lidos pareciam ter sido escritos para hoje; uma atualidade impressionante”. E que D.Manuel é favorável à abertura do seu processo de canonização. Quem foi este homem “normal” tão excecional?

 

Foi deputado à Assembleia Nacional, em representação da Igreja (de 1938 a 1942). Não voltou ao lugar nas legislaturas seguintes, porque as suas principais intervenções foram vistas como hostilidade governamental. O seu amor à classe trabalhadora e o conhecimento que dela tinha fizeram dele fundador e assistente da LOC. A ele se deve a criação de um centro de reintegração na Amadora e no Porto e a fundação da Liga Nacional Contra a Prostituição, atividade que veio a ser reprimida. Em 1948 sentiu-se obrigado a deixar o lugar de professor do Instituto de Serviço Social, que ocupava desde 1938, sob a ameaça de a escola cessar de receber o subsídio do Governo, caso ele não saísse.

 

Cansado e doente, foi aconselhado, em 1957, a retornar à terra natal, onde ainda criou, com amigos, a Sociedade Avícola do Minho. Vigiado pela PIDE, durou seis anos e meio o seu cativeiro. Dava tudo o que tinha. Dava até a sua própria roupa pessoal. "Não há um dia de sossego, meu Deus! Sempre a miséria a rondar-me a porta... e eu sem lhes poder valer!", dói-lhe no seu "Diário". E diz mais: "Não gostei da procissão! (...) A Procissão dos Passos é de todos os dias mas não tem andores, nem música, nem anjinhos. Tem dores, angústias, desesperos, lágrimas, lamentos, e chagas. São os ódios de raças, as lutas fratricidas, os colonialismos, os campos de concentração, a opressão das consciências, as limitações da personalidade e da liberdade humanas, a fome, o desemprego, os bairros de lata, os acidentes de trabalho e de estrada, as prepotências e desmandos do capital, a exploração de menores, a escravatura da mulher, os compadrios, as injustiças, os egoísmos (...) Tudo isto flagela, dilacera, crucifica o Corpo de Cristo, como nunca talvez na História da Humanidade".

 

Abel Varzim emitia opiniões inconvenientes para o regime. Pressionava muitas vezes Cerejeira. De acordo com D. Manuel Clemente, em algumas situações, aquele acabou por encobrir as atividades do pároco, porque considerava que ele era a chamada “reserva da Igreja”, caso a ditadura tivesse um fim. Era a esperança de muitos, em Portugal, no pós guerra, afirmou D. Manuel. Não estava a dormir e, parece-me, que não vai para a cama tão cedo.

 

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